Texto:
O pirarucu amazônico já é um dos peixes mais procurados em restaurantes especializados no Brasil.
Para conhecer a origem do peixe desde o início da cadeia produtiva até a mesa do consumidor, diversos chefs foram convidados para saber como a espécie é manejada na Reserva de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá, no Amazonas.
Além de preservar e capturar o pirarucu de forma sustentável, outro objetivo é vender a espécie para o mercado nacional e internacional.
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Narração
'O manejo do pirarucu é um dos exemplos mais impressionantes que temos no mundo de conservação da biodiversidade e melhoria da qualidade de vida das populações locais. Além de recuperar populações selvagens de pirarucu, o manejo possibilitou uma série de benefícios sociais, econômicos e culturais.'
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- Porto de Carauari, Amazonas
Priscila Deus - Chef
'A expectativa como chef de cozinha de entrar na Amazônia é sensacional.
Estar em contato com a natureza, conhecer realmente o centro do nosso país e do mundo.
Então estou me sentindo completamente grato.
E espero sair daqui com essa energia maravilhosa, sentindo essa paz aqui.'
Daiti - Chefe de cozinha
"Acho que é muito importante para nós, cozinheiros, entender de onde vem o alimento, como ele é tratado, como é cuidado, como é pescado, como é armazenado... é... pelo menos para mim fazer um prato que tenha uma história."
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Adevaldo Dias - Presidente do Instituto Chico Mendes (ICMBio)
'Essa expedição de incluir os chefs aqui do médio Juruá, na comunidade de São Raimundo, é uma estratégia de engajamento... é uma estratégia nossa do coletivo pirarucu, de engajar mais atores nessa estratégia de gestão comunitária.'
Ana Cláudia Torres - Instituto Mamirauá
'É justamente para sensibilizar os chefs, para que eles sejam o que chamamos de embaixadores do pirarucu.
Em seus restaurantes, para sua clientela, eles podem apresentar o produto, falar dessa história amazônica que é tão linda e bacana.'
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Viagem de barco de 24 horas - (roda de pé)
Mais 2 horas de canoa - (roda de pé)
Priscila Deus - Chef
É neste quarto que vou dormir esta noite?
- Resposta (homem de camisa verde): Este é.
Onde está minha rede?
Oh, que coisa linda!
Um bebê segurando outro bebê.
É !
É seu! (homem de camisa laranja)
Isso é meu, sim!
Deixe-me ajudar você.
O problema é saber dar o nó, certo?
É a primeira vez que durmo numa rede!
Ah, é a primeira vez? (homem de camisa laranja)
- Resposta: Primeira vez.
É para você não precisar cair! (homem de camisa laranja)
'Risos
Pronto... agora!
Agora estou confortável.
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Comunidade São Raimundo
Raimundo - Presidente da Comunidade São Raimundo
'A Comunidade São Raimundo é uma comunidade que antigamente era conhecida como comunidade da mandioca, nós morávamos fora da unidade de conservação. E aí a gente sentiu a necessidade de mudar, quando foi criada a Reserva e tudo, e aí a gente sentiu a necessidade de mudar para a unidade de conservação. Então a gente chegou aqui com uma média de 20 famílias. Hoje são 42 famílias aqui na comunidade São Raimundo. E então, as principais atividades econômicas são: manejo do pirarucu, extrativismo em geral, incluindo oleaginosas como andiroba, murumuru e cuúba.
Tem também a extração da borracha, que é uma cultura da comunidade. Tanto que hoje tem muito mais gente jovem cortando borracha do que gente velha, porque é uma atividade que é passada de pai para filho, e a agricultura familiar com farinha. Então são essas atividades que geram renda para a comunidade.'
Dona Moça - moradora da comunidade
'Moramos aqui há quatro anos.
Não falta nada aqui?
- Resposta: Não
Você quer ir embora?
- Resposta: Não.
Quantas crianças?
- Resposta: 9.
Mas todos eles moram aqui?
-Resposta: Todos eles.
Essa é minha mãe!
Qual o seu nome?
- Resposta: Maria
Ela veio me visitar, ela mora em outro lugar.
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Manuel Cunha - ICMBio
'Até a década de 1980, vivíamos em um sistema de semiescravidão introduzido pelos patrões da borracha que tomaram conta da terra, mas não eram donos dela.
Lutamos para sair das garras dos patrões. Nós nos organizamos para sair das garras deles, mas fomos impedidos de retirar a borracha. Lutamos novamente e obtivemos a posse da região e a criação da reserva extrativista do médio Juruá em 4 de março de 1997.'
'As comunidades estavam preocupadas com todas as espécies que estavam desequilibradas. Os quelônios e o pirarucu eram os mais preocupantes. Então a comunidade decidiu monitorar as espécies. Começou a aparecer muito pirarucu, tanto que conseguimos alimentar toda a comunidade e ainda sobrar o suficiente para o manejo.'
(roda pé - 1ª gestão da Reserva Juruá foi em 2011)
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Ana Cláudia Torres - Instituto Mamirauá
'Como tecnologia social, o manejo do pirarucu se conecta com a população por meio dessa interação. O conhecimento científico e o conhecimento tradicional se baseiam nessa fundação, que é justamente essa união entre esses dois tipos de conhecimento.'
Jota - Instituto Juruá
'O pirarucu é uma espécie fantástica que evoluiu em um ambiente com baixo teor de oxigênio.
Quando nasce, ele respira pelas guelras, mas à medida que cresce, ele muda sua maneira de respirar e começa a respirar pela bexiga natatória de uma forma modificada.
de uma forma modificada, então ele tem que vir à superfície para capturar oxigênio. Quando ele captura oxigênio e ele faz isso a cada 20 minutos, os pescadores percebem que esse é o momento em que você pode contar quantos indivíduos tem no lago. Então, pela fisiologia respiratória do pirarucu, é possível saber quantos pirarucus tem em cada lago. Isso ajuda no processo de gestão, porque através do número total de peixes você consegue pensar em uma cota sustentável, que é aquela parte a ser pescada sem comprometer o estoque de pirarucu naquele lago.'
dois pescadores na canoa
'Olha ali... aquele flutuou para longe. Você não viu?
Ele flutuou.
Ana Cláudia Torres - Instituto Mamirauá
Duas classes de tamanho de pirarucu são contadas: pirarucu de 1 metro a 1,5 metro são considerados juvenis, e de 1,5 metro são considerados adultos. Pirarucu com menos de 1 metro não são contados, por quê? Porque o cardume pode ser confundido com o cardume de outros peixes. Isso pode levar à contagem dupla.
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Francisco 'Bacote' - pescador
'Quando chega o dia, ficamos ansiosos... bom, já está claro... já vamos começar a pescar.
Eu me sinto bem! É uma alegria pescar. Eu me sinto bem pescando.'
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Francisco 'Bacote' - pescador
'Vemos onde a maioria dos peixes está reunida. Onde eles estão flutuando mais. Sabemos que quanto mais peixes estão flutuando, mais peixes estão reunidos. Colocamos o que chamamos de malha. Colocamos a mil metros de distância.'
Francisco 'Tico' - pescador (na canoa)
'Você pega o peixe primeiro, depois espera ele parar de se mexer. Isso faz com que ele desmaie e então você corta a garganta do pirarucu. Coloca na canoa, marca o horário em que foi pego. Depois de pegar oito, nove ou 10 pirarucus, o transportador leva o peixe para outro barco para ser tratado e embalado.
narração (homem de uniforme branco com boné)
'Vamos fazer o processo biométrico aqui. Centro e setenta e seis centímetros. Hora do abate 9h52. Coloque o selo.'
narração
'O processo de processamento do peixe aqui é feito por mulheres'
- banner: '10 mulheres estão encarregadas de estripar o pirarucus.'
As mulheres começam seu trabalho removendo os pulmões do pirarucu. Elas fazem isso muito rapidamente. Depois disso, o peixe é lavado e escovado para ficar limpo. O pirarucu é então pesado e colocado no gelo.'
João da Mata - analista ambiental do ICMBio'
O estado do Amazonas possui um ambiente regulatório muito favorável ao desenvolvimento da gestão em comparação a outras áreas.
A legislação federal estabelece a proibição da pesca por seis meses, e o governo do Amazonas estendeu o nível de proteção para essa atividade pelo resto do ano.
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Manuel Cunha - ICMBio
'Quando acontece a pesca, a Asproc - Associação dos Produtores Rurais de Carauari - tem outro papel, que é a comercialização.
Por exemplo: pegamos 30 toneladas de peixe. Depois mandamos para a Asproc, em Carauari, para comercialização.'
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Cidade de Carauari - Amazonas - Brasil
Manuel Cunha - ICMBio
'A Asproc receberá, verificará e pesará o peixe. Então colocaremos o peixe na geladeira e iniciaremos o processo de processamento.'
Manelzinho - gerente de matadouro
'A cota que estamos solicitando é baseada em compromissos que já assumimos, ou que já estão em negociação, para não ficarmos com estoque sem poder negociar. Além de abastecer o estado do Amazonas, também vendemos para as cidades do Rio de Janeiro e São Paulo, Belo Horizonte, Brasília e Recife. Nosso próximo passo será um experimento de exportação.'
Pedro Constantino - serviço florestal
'Tivemos que começar a trabalhar a comunicação e a promoção de um produto que não era muito conhecido no mercado. Por isso criamos a marca 'Taste of the Amazon'. Uma marca coletiva que representa todos os gestores, os arranjos de manejo de pesca do pirarucu que compõem esse coletivo e que carrega atributos e valores.'
Adevaldo Dias - Presidente do Instituto Chico Mendes (ICMBio)
'O peixe que carrega essa marca é uma garantia de origem de manejo sustentável. Outro aspecto da marca é a representação justa com a comunidade. Não basta ser um pirarucu, é preciso ser e consumir um pirarucu que tenha uma relação, uma remuneração justa para quem o maneja, como a comunidade de São Raimundo.'
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Priscila Deus - Chef
'Ouvi dizer que hoje vai chegar um pirarucu especialmente para os chefs daqui, e vamos fazer alguns pratos especialmente para a comunidade aqui de São Raimundo, para que eles possam experimentar algo diferente feito por nós. Estamos esperando o peixe chegar, mas já temos algumas ideias. Estamos falando de grelhar o pirarucu.
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Daiti - Chefe de cozinha
'Vou fazer ceviche, e vou fazê-lo empanado. Estou apenas escolhendo as melhores partes para fazer o ceviche.'
Priscila Deus - Chef
'Aqui temos uma barriga com ossos. Estou fazendo como se fosse um corte bovino de pirarucu. Temos a barriga com osso. Estamos fazendo o lombo e a barriga com osso para assar para o pessoal aqui da comunidade no jeito tradicional da parilla.'
Manuel Cunha - ICMBio (entre o povo)
'Nunca imaginamos um pirarucu cortado com costela, osso, espinha, tudo, e com uma aparência muito bonita, sei que é muito bom. Desejamos a todos uma boa refeição.'
Daiti - Chefe de cozinha
'Eu venho do Japão, então na nossa cultura a comida é crua. Então esse é um desafio para todos na comunidade. Eu fiz um ceviche oriental, é cru. Mas é fresco e saboroso. Tudo o que você precisa fazer é experimentar, é bom! Você não vai fugir!
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Residente da comunidade
'Impressionante! Tivemos o privilégio de aprender a fazer esses pratos com os chefs. Costumávamos preparar o pirarucu de forma diferente. Dessa vez, achei excelente.
Ted - EUA
'Parabéns, gostei muito do ceviche que você fez. Sei que a comunidade não está acostumada a comer peixe cru, mas é realmente uma delícia. Gostei muito também do churrasco de pirarucu, que estava uma delícia.
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Manuel Cunha - ICMBio
'Uma comunidade desorganizada não é nada! Ela não tem prosperidade. Ela não tem produção organizada. E ela acaba não progredindo na velocidade que precisa. Um dos critérios para a gestão é ter uma comunidade organizada. O benefício vem da organização dos grupos. Quando você fortalece a organização comunitária, você fortalece sua associação-mãe. Com sua associação-mãe fortalecida, ela consegue captar mais recursos, tem capacidade de discutir projetos, elaborar políticas públicas para apresentar ao governo, que é um pouco do que a Asproc faz aqui no médio Juruá.
Raimundo - Presidente da Comunidade São Raimundo
'Quando falamos do coletivo, falamos também da integração de outros gêneros. Sabemos que é uma atividade de pesca, que há mais homens, principalmente os mais velhos pela experiência. Então sentimos a necessidade de incluir jovens e mulheres. E aí, na primeira gestão, poucas mulheres participavam. E as que participavam ganhavam menos que os homens. O mesmo acontecia com as mais jovens. Na segunda gestão, mudamos esse processo. Como é um trabalho coletivo, a remuneração passou a ser igual.'
Maria Cunha - agente de telessaúde
'Especificamente, a cadeia do pirarucu fortaleceu não apenas as mulheres veteranas, que eram esposas dominadas. Elas tinham que se submeter como donas de casa,
para cuidar apenas dos filhos e maridos. Também fortaleceu as mulheres a pensar além do termo comunidade. Hoje, elas se veem como gestoras, extrativistas,
pescadoras e presidentes de associações. Elas também se veem como representantes da comunidade.'
Jota - Instituto Juruá
'O manejo do pirarucu, e de outras cadeias também, parece ser um grande modelo para a Amazônia. Onde podemos explorar a natureza de forma sustentável, garantindo justiça social. E que essa exploração seja liderada por comunidades e associações locais. Garante espaço para lideranças locais
na tomada de decisões. E, acima de tudo, que os benefícios da exploração dos recursos naturais sejam melhor distribuídos. Gerando renda para as comunidades
que protegem grande parte da floresta.'
Priscila Deus - Chef
'Embora eu saiba que o produto que compro nos restaurantes de São Paulo vem daqui, eu apoio a comunidade comprando o produto. É muito diferente ver e entender toda a organização que acontece em torno de um produto. É uma experiência sensacional e emocionante.'
Vera - Cozinheira
'Eu realmente acredito que quando você conhece toda a cadeia de produção, agregando valor, e leva isso ao consumidor final para que ele entenda o preço do produto, a origem e a logística. Você o ensina a apreciar e entender melhor a comida não olhando apenas o preço, mas o valor.'
***faixa final***
Fonte: Agência Amazônia